SOS Obesidade

Ciência

Nesta categoria, mergulhamos nas pesquisas, descobertas e avanços científicos que ajudam a entender e combater a obesidade. Trazemos estudos, análises e explicações de especialistas para traduzir o conhecimento acadêmico em informações claras e úteis, aproximando a ciência do seu dia a dia.

6 artigos
A Obesidade no Meio Acadêmico: Pesquisas, Desafios e Impactos Sociais
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A Obesidade no Meio Acadêmico: Pesquisas, Desafios e Impactos Sociais

A obesidade é considerada pela organização mundial da saúde uma das maiores epidemias do século xxi. estima-se que mais de 1 bilhão de pessoas no mundo convivam com excesso de peso, incluindo crianças e adolescentes. diante desse cenário, o meio acadêmico tem se mobilizado em diferentes frentes de pesquisa para compreender não apenas os aspectos biológicos, mas também os sociais, econômicos e psicológicos da condição. pesquisas em crescimento nos últimos 20 anos, o número de publicações científicas sobre obesidade aumentou exponencialmente. as áreas mais estudadas incluem: nutrição e metabolismo: efeitos de dietas, jejum intermitente, macronutrientes. psicologia e comportamento alimentar: como compulsão, ansiedade e estresse afetam o peso. políticas públicas: impacto de taxação de bebidas açucaradas, rotulagem de alimentos e programas escolares. tecnologia em saúde: uso de aplicativos, wearables e inteligência artificial para monitorar hábitos. esse crescimento mostra que a obesidade deixou de ser problema individual e passou a ser pauta central em saúde coletiva. o peso do ambiente social estudos acadêmicos também revelam que a obesidade não pode ser dissociada do contexto socioeconômico. ambientes urbanos pobres em espaços para atividade física, oferta de alimentos ultraprocessados a baixo custo e jornadas de trabalho exaustivas contribuem para o aumento da prevalência. pesquisadores defendem o conceito de “ambiente obesogênico”, ou seja, sociedades que estimulam o ganho de peso por meio de estímulos externos. essa perspectiva amplia o debate para além da escolha individual, exigindo políticas estruturais. o impacto psicológico no campo das ciências sociais e da psicologia, há um foco crescente no estigma. pessoas com obesidade relatam discriminação em ambientes escolares, de trabalho e até mesmo nos serviços de saúde. estudos apontam que o preconceito agrava quadros de depressão, ansiedade e compulsão alimentar, criando um ciclo difícil de romper. academia como agente de mudança universidades e centros de pesquisa não se limitam à produção de artigos. muitas instituições mantêm programas de extensão comunitária, oferecendo acompanhamento multiprofissional gratuito ou a baixo custo, além de projetos educativos em escolas e comunidades. assim, a ciência se conecta diretamente com a população. conclusão a obesidade é um fenômeno científico e social, e o meio acadêmico desempenha papel central em compreendê-la e enfrentá-la. o desafio é integrar diferentes áreas do conhecimento — medicina, nutrição, psicologia, educação, economia — para propor soluções eficazes e humanas. mais do que reduzir números na balança, o objetivo das pesquisas é melhorar qualidade de vida e diminuir desigualdades sociais ligadas ao peso.

O Avanço da Ciência no Estudo da Obesidade: Da Genética às Novas Terapias
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O Avanço da Ciência no Estudo da Obesidade: Da Genética às Novas Terapias

A obesidade deixou de ser vista apenas como resultado de “má alimentação” ou “falta de exercício”. hoje, a ciência reconhece que se trata de uma doença crônica, multifatorial e complexa, influenciada por genética, ambiente, metabolismo, fatores psicológicos e até mesmo sociais. esse novo olhar tem transformado a forma como a academia estuda e combate a condição. a genética da obesidade pesquisas recentes identificaram centenas de genes relacionados ao acúmulo de gordura e ao controle do apetite. isso significa que algumas pessoas nascem com maior predisposição a ganhar peso, mesmo mantendo hábitos semelhantes aos de indivíduos magros. a variação do gene fto, por exemplo, está fortemente ligada ao aumento do risco de obesidade. no entanto, a genética não é uma sentença definitiva: o ambiente — qualidade da alimentação, nível de atividade física, sono e estresse — continua sendo determinante. o conceito atual é de que obesidade resulta de uma interação entre genes e estilo de vida. o papel do microbioma outro campo promissor é o estudo da flora intestinal. pesquisas apontam que pessoas com obesidade apresentam desequilíbrio no microbioma, com bactérias que favorecem a absorção de calorias extras e influenciam hormônios ligados à fome. isso abre espaço para terapias com probióticos, prebióticos e transplante de microbiota fecal, ainda em fase experimental, mas com resultados animadores. terapias inovadoras na última década, o desenvolvimento de medicamentos revolucionou o tratamento. fármacos injetáveis como os agonistas de glp-1 (caso da semaglutida) mostraram redução significativa de peso e de riscos associados, como diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares. a ciência segue explorando novas moléculas que atuam em múltiplos hormônios reguladores do apetite. além disso, a área acadêmica tem aprimorado técnicas de cirurgia bariátrica e metabólica, hoje indicadas não só para emagrecimento, mas também para melhora de condições como diabetes e hipertensão. a visão acadêmica mais ampla universidades e centros de pesquisa defendem uma visão mais humanizada: tratar a obesidade como condição médica e não como falha de caráter. esse entendimento combate o estigma social e direciona políticas públicas mais eficazes, desde programas de prevenção até acesso a medicamentos pelo sistema de saúde. conclusão a ciência transformou a forma como entendemos a obesidade. hoje, não se fala apenas em dieta e exercícios, mas em genética, microbioma, medicamentos, cirurgia e ambiente social. o futuro aponta para tratamentos cada vez mais personalizados, que levem em conta a singularidade de cada paciente.

Mounjaro: brasileiros importam remédio, que reduz mais o peso que o Ozempic; saiba valores e previsão para chegar no país
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Mounjaro: brasileiros importam remédio, que reduz mais o peso que o Ozempic; saiba valores e previsão para chegar no país

Aos 37 anos, o engenheiro e empresário paulista eric freitas lutava contra a obesidade desde quando era criança. no início deste ano, recebeu uma proposta de um amigo médico no dia do seu aniversário: um tratamento com um remédio “inovador” que traria resultados semelhantes aos de uma cirurgia bariátrica. ele foi a uma consulta com seu irmão gêmeo, éder. juntos, descobriram um medicamento originalmente usado para tratar diabetes e que ainda não tem data marcada para chegar às farmácias brasileiras, o mounjaro. eric conta que pagou uma média de r$ 15 mil por mês pela importação do remédio e orientação médica em uma clínica especializada em são paulo. após iniciar o tratamento no começo deste ano, o empresário relata que os resultados não demoraram para chegar: os irmãos perderam 22 quilos cada em um mês. — eu fiz o tratamento, fiquei sem fome nenhuma. ele dá uma disposição surreal. já tinha feito todos os tratamentos que você puder imaginar na vida. perdi 20 quilos de gordura em um mês, sou outra pessoa — contou ele, que, após três meses usando o remédio, interrompeu a aplicação e deu início a um processo de ganho de músculos. quanto custa o mounjaro? embora o medicamento tenha sido aprovado pela agência nacional de vigilância sanitária (anvisa) no ano passado, ele ainda não está disponível no mercado brasileiro. por isso, quem o utiliza precisa trazê-lo do exterior, o que eleva ainda mais os custos. nos estados unidos, o tratamento de um mês custa por volta de us$ 1 mil dólares, o equivalente a mais de r$ 5,1 mil na cotação atual. como importar o mounjaro? a anvisa permite que o paciente importe no máximo o suficiente para um tratamento de seis meses, ou seja, seis caixas com 24 canetas no total, que saem entre r$ 40 mil a r$ 55 mil, considerando os custos para importar o produto. o que é mounjaro e para que serve? por conta do custo, o mounjaro foi apelidado de “ozempic [https://oglobo.globo.com/tudo-sobre/assunto/ozempic/] dos ricos”. assim como seu “primo”, ele foi criado para tratar diabetes tipo 2 e é aplicado por meio de injeções. no entanto, o medicamento vem sendo amplamente usado de forma “off label” (finalidade diferente da bula) para emagrecimento. como o ozempic, mais famosa das canetas emagrecedoras, o remédio retarda o esvaziamento do estômago, o que faz com que a pessoa se sinta saciada por mais tempo. qual o valor do mounjaro no brasil? como o remédio está autorizado no brasil, a câmara de regulação do mercado de medicamentos (cmed) já estabeleceu um teto de preço para o medicamento: no máximo, entre r$ 1.677,10 (duas canetas) a r$ 3.782,17 (quatro canetas), a depender da alíquota do icms em cada estado e da dose. apesar disso, ainda não há data para o medicamento chegar às prateleiras brasileiras, o que depende de decisão da farmacêutica responsável. o ozempic tem como preço máximo entre r$ 1.143,82 e r$ 1.289,75, e é vendido nas farmácias.

Fiocruz fecha acordo para produzir canetas emagrecedoras brasileiras
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Fiocruz fecha acordo para produzir canetas emagrecedoras brasileiras

Acordo prevê transferência de tecnologia para fabricar as chamadas “canetas” com liraglutida e semaglutida, usadas no controle da glicemia e na perda de peso. produção começará na ems e será transferida à farmanguinhos. a fundação oswaldo cruz (fiocruz) assinou um acordo de parceria com a farmacêutica brasileira ems para viabilizar a produção nacional de canetas emagrecedoras usadas no tratamento de diabetes tipo 2 e obesidade. o anúncio foi feito nesta quarta-feira (6), durante um evento em brasília com a presença do ministro da saúde, alexandre padilha. o foco da parceria são os medicamentos que contêm liraglutida e semaglutida — substâncias que atuam no controle da glicose e também contribuem para a perda de peso. eles são aplicados por meio de dispositivos semelhantes a canetas, como os medicamentos ozempic e wegovy. a parceria foi anunciada dias depois de a ems lançar a primeira caneta emagrecedora produzida integralmente no brasil. batizada de olire, ela é feita à base de liraglutida e também é utilizada para o tratamento da obesidade e diabetes. como será a produção o acordo prevê a transferência da tecnologia completa de fabricação: tanto da síntese do ingrediente farmacêutico ativo (ifa) quanto da formulação final do medicamento. inicialmente, a produção será feita na fábrica da ems, em hortolândia (sp). a etapa seguinte será a transferência para o complexo tecnológico de medicamentos de farmanguinhos, unidade da fiocruz no rio de janeiro. ainda não há prazo definido para que a produção seja totalmente nacionalizada, mas a intenção é que farmanguinhos assuma o processo gradualmente, o que pode reduzir a dependência de importações e baratear os custos no futuro. medicamentos poderão ser usados no sus? segundo o ministério da saúde, a expectativa é que, com a produção local, o uso desses medicamentos pelo sistema único de saúde (sus) possa ser ampliado, principalmente no caso de pacientes com obesidade grave. hoje, os remédios à base de semaglutida e liraglutida ainda têm custo elevado e acesso restrito na rede pública. o ministro alexandre padilha disse que o governo estuda oferecer os medicamentos a pacientes que aguardam por cirurgias bariátricas, caso estudos mostrem impacto positivo na saúde desses grupos. patentes devem vencer em 2026 a produção nacional também se antecipa à expiração das patentes desses medicamentos no brasil. a do ozempic, por exemplo, termina em março de 2026. isso deve abrir caminho para a entrada de versões genéricas, o que tende a aumentar a oferta e reduzir os preços no mercado. empresas como biomm e hypera pharma já se preparam para lançar produtos similares após o vencimento das patentes. o acordo entre fiocruz e ems, no entanto, é considerado o primeiro com transferência completa de tecnologia para o setor público.

Pesquisa aponta caminho inédito contra a obesidade
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Pesquisa aponta caminho inédito contra a obesidade

> estudo revela como uma molécula ativa a queima de energia no tecido adiposo, sem afetar o apetite > >   vanessa almeida da silva [https://conexao.ufrj.br/author/vanessa/] recentemente publicada na revista nature metabolism, uma descoberta desenvolvida em parceria entre universidades brasileiras e o instituto pasteur de montevidéu pode revolucionar o mercado de medicamentos para obesidade. o trabalho reúne cientistas da universidade federal do rio de janeiro (ufrj), universidade estadual de campinas (unicamp) e universidade de são paulo (usp) e aponta para uma nova substância capaz de induzir a perda de peso por meio de um mecanismo celular pouco explorado, sem interferir no apetite ou atuar no sistema nervoso central. juliana camacho, professora do instituto de bioquímica médica (ibqm) da ufrj, é uma das colaboradoras. a etapa inicial foi financiada pelo instituto pasteur de montevidéu e pela eolo pharma, empresa de biotecnologia pioneira em novas abordagens para tratar obesidade e doenças metabólicas. o coordenador do estudo é o dr. carlos escande, pesquisador do laboratório de doenças metabólicas e envelhecimento do instituto pasteur de montevidéu. como a droga funciona: uma termogênese diferente  os experimentos mostram que a nova droga é capaz de realizar uma termogênese –  processo pelo qual o corpo produz calor, aumentando o gasto energético e, consequentemente, a queima de calorias – diferente da convencional. até o momento chamado de sana – do inglês salicylate-based nitroalkene –, o fármaco é um derivado do salicilato, um composto orgânico base para outros medicamentos com propriedades analgésicas e anti-inflamatórias. em experimentos iniciais, observou-se uma redução significativa de peso em animais. a hipótese inicial era de que a substância ativasse o caminho clássico da termogênese, por meio da proteína desacopladora na mitocôndria. mas testes com inibidores mostraram que o efeito não acontecia por esse caminho. a partir daí, a equipe investigou outra possibilidade: um mecanismo de reciclagem de creatina, conhecido como ciclo fútil. nesse processo, a creatina captura atp, forma fosfocreatina e depois libera novamente, mantendo a produção de energia ao mesmo tempo em que gera calor. isso força o corpo a consumir mais nutrientes, aumentando o gasto calórico total. nos testes, a substância demonstrou reduzir o peso de roedores mesmo em dietas ricas em gordura, além de melhorar a sensibilidade à insulina e reduzir o acúmulo de gordura no fígado. esses efeitos também abrem caminho para estudos em doenças metabólicas como diabetes tipo 2 e esteatose hepática. ciência básica: uma conquista coletiva para juliana camacho, entender o funcionamento da mitocôndria, analisar como o tecido adiposo consome energia ou oxigênio é parte de uma ciência aparentemente básica, mas que pode ser o ponto de partida para transformar um composto em potencial medicamento. o impacto vai muito além da obesidade tratada como questão estética: doenças metabólicas estão diretamente ligadas ao envelhecimento populacional, ampliando riscos de diabetes, doenças cardiovasculares e até alzheimer. no brasil, o cenário é especialmente preocupante. a população idosa cresce rapidamente, sem infraestrutura proporcional. segundo juliana, estima-se que, nos próximos 50 anos, podemos ter 40% da população brasileira com mais de 60 anos e 70% dos idosos dependem exclusivamente do sus para tratar doenças crônicas.  juliana compartilha a conquista com sua equipe. leonardo de souza, aluno de mestrado no programa de pós-graduação em bioquímica (ppgbq – ufrj), lembra dos desafios do laboratório: a extração de mitocôndrias de tecido adiposo exigiu meses de protocolos complexos. “o tecido era pequeno, muito gorduroso, e a gordura interfere na extração de mitocôndrias. foram dias começando às sete da manhã e terminando à meia-noite para ajustar tudo”, conta. para ele, ver o trabalho reconhecido em uma revista científica de prestígio internacional é um passo que mostra o valor da ciência feita no brasil. o que vem a seguir  em animais, a redução de peso ocorreu em média em oito semanas de tratamento. a fase 1 de testes clínicos em humanos, realizada com um pequeno grupo de no máximo oito pessoas, confirmou a segurança da substância e apontou redução de peso similar à de medicamentos já aprovados para obesidade. ainda assim, os pesquisadores ressaltam que a eficácia só poderá ser confirmada em fases clínicas mais avançadas, que exigem recursos financeiros elevados e grandes grupos de voluntários. com a conclusão da fase 1 – chamada fase de segurança –  restam ainda as fases 2 e 3 para que a substância possa, futuramente, passar a ser um medicamento. a fase 2 avalia a eficácia da droga e investiga possíveis efeitos colaterais em um grupo maior de voluntários. já a fase 3 amplia ainda mais o número de participantes, podendo envolver milhares de pessoas, para confirmar a eficácia, monitorar reações adversas e comparar os resultados com tratamentos já existentes. depois de todas essas fases de testes é que se torna possível afirmar que a droga pode ser transformada em medicamento para a população. o desenvolvimento dessas etapas costuma depender do interesse de grandes farmacêuticas, já que exige alto investimento e infraestrutura para os testes em larga escala. com a fase 1 concluída, o ibqm/ufrj segue investigando outras possibilidades. o próximo objetivo é entender, em detalhes, como o ciclo da creatina se conecta a outras proteínas e vias bioquímicas, abrindo novas perspectivas para tratamentos futuros. “a ciência é isto: nada se cria, tudo se transforma. ainda queremos descobrir quais outras proteínas e vias podem estar envolvidas e, quem sabe, abrir portas para novos tratamentos”, conclui juliana.

A mutação genética descoberta por pesquisadores brasileiros que favorece a obesidade
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A mutação genética descoberta por pesquisadores brasileiros que favorece a obesidade

O que se sabe hoje sobre obesidade, doença que dobrou entre os brasileiros nos últimos 20 anos, chegando a cerca de 25% da população, é que ela tem causas complexas, que envolvem estilo de vida e fatores ambientais e genéticos e a interação entre eles. um grupo de pesquisadores brasileiros descobriu uma nova variante genética que pode estar ligada a uma predisposição em mulheres ao aumento do índice de massa corporal (imc), uma medida internacional usada como parâmetro para o cálculo do peso ideal. a variante, batizada de rs114066381, é de origem africana e está presente em ambos os sexos, mas só atua em mulheres adultas miscigenadas. a incidência na população é de 1%, com um percentual ligeiramente maior em regiões com maior ancestralidade africana, como a nordeste. o trabalho, que começou em 2017, liderado por pesquisadores da universidade federal de minas gerais (ufmg), foi publicado na revista científica international journal of obesity [https://www.nature.com/articles/s41366-021-00761-1], uma das mais prestigiosas na área de obesidade. foi realizado em conjunto por cientistas de 22 instituições, 11 do brasil e sete dos estados unidos, uma do peru, uma da áfrica do sul, uma de gana e uma da austrália. de acordo com o líder do grupo brasileiro, eduardo tarazona santos, do departamento de genética, ecologia e evolução, do instituto de ciências biológicas da ufmg, o objetivo do trabalho era encontrar variantes que favorecessem a obesidade, em particular de origem africana ou indígena, que são as menos estudadas em todo o mundo. entre as mutações relacionadas à obesidade, a maior parte das conhecidas hoje no mundo foi encontrada em populações de origem europeia. são cerca de 230, que atuam especificamente em mulheres, e 134 em homens. "o efeito dessas variantes — nós podemos ter 0, 1 ou 2 cópias — no imc em indivíduos do sexo feminino pode variar de 0,009 a 0,48 kg/m² (em unidades desse índice), dependendo de qual se analisa, enquanto nos do masculino atinge no máximo a 0,095 kg/m²", informa tarazona. o imc é calculado dividindo-se o peso em quilogramas pelo quadrado da estatura em metros. de acordo com a organização mundial de saúde (oms), as pessoas com um índice entre 25 e 29,99 kg/m² são consideradas com sobrepeso, entre 30 e 39,99, obesas, e acima de 40, com obesidade mórbida ou grave. "a variante que encontramos, chamada rs114066381, predispõe para um aumento do imc que pode ir de 2,32 a 5,65 kg/m², com uma média de 3,9 kg/m²", diz a bióloga marília de oliveira scliar, que também participou do trabalho, quando fazia doutorado em genética na ufmg. "curiosamente, isso é observado apenas em adultas miscigenadas. para os homens, ela não tem nenhum efeito." para encontrá-la, os pesquisadores usaram os dados do projeto epigen-brasil, financiado pelo ministério da saúde, que, entre 2009 e 2013, estudou a diversidade genômica de 6.487 indivíduos, analisando cerca 2,3 milhões de variantes genéticas, espalhadas ao longo de todo o genoma humano. também foram estudados dados de imc, renda, sexo, idade e ancestralidade europeia, africana e nativo-americana de cada um deles. do total de pessoas estudadas pelo epigen, o grupo liderado por tarazona pesquisou 6.192 (3.280 mulheres e 2.912 homens), dos quais 1.222 (664 e 558), de salvador (ba); 1.342 (821 e 521), de bambuí (mg) e 3.628 (1.795 e 1.833), de pelotas (rs). "o primeiro grupo era composto de indivíduos que tinham entre 4 e 11 anos, em 2005, quando o imc deles foi medido; o segundo de maiores de 60 anos, em 1997, e o terceiro de nascidos em 1982", conta tarazona. > foi justamente neste último grupo que encontramos a variante primeiro. também foi neste contingente no qual ela mostrou ter o maior efeito — os 5,65 kg/m². > > eduardo tarazona santos de acordo com o pesquisador, apesar de a população de pelotas ter 76% de ancestralidade europeia e apenas 16% africana e 8% indígena, não foi algo assim tão inesperado encontrar a mutação ligada à ancestralidade africana primeiro nela. "isso ocorreu porque a amostra é a maior que estudamos e, por isso, havia maior probabilidade estatística de descobrir coisas novas do que em grupos menores", explica. mesmo assim, tarazona considera "interessante" que uma variante africana tenha sido encontrada em uma das populações mais europeias do brasil. para ele, a descoberta mostra que os brasileiros miscigenados, mesmo com a maioria de indivíduos brancos, podem possibilitar achados sobre mutações de origem africana. "isso faz da miscigenação um fenômeno relevante do ponto de vista da pesquisa biomédica", diz. segundo marília, a descoberta em pelotas mostra que grande parte da população brasileira, mesmo aquela que se declara branca, é miscigenada, ou seja, carrega em seu dna variantes de origem africana, que podem estar associadas a diferentes doenças ou características. "por isso, nosso achado demonstra a importância e a necessidade de incluir populações não europeias em estudos genômicos", diz. depois da descoberta na cidade gaúcha, os pesquisadores confirmaram o resultado analisando mais especificamente as mulheres idosas de bambuí e são paulo. "não vimos associação nas de salvador, mas elas eram crianças" diz tarazona. "em seguida, fomos atrás de replicar esse resultado em outras populações do mundo. ele foi confirmado parcialmente em mulheres de porto rico, mas não nas da áfrica ocidental e da áfrica do sul." para os cientistas, o fato de a nova variante que descobriram atuar apenas em mulheres adultas miscigenadas merece atenção do ponto de vista biológico e evolutivo. isso porque as mulheres possuem mutações que têm um efeito maior no acúmulo de gordura do que os homens. "é algo pode ter a ver com nossa evolução", diz tarazona. "tendo que engravidar e amamentar os filhos, elas podem ter precisado, em algum momento do passado, acumular mais gordura como reserva energética." isso teria sido favorecido pela seleção natural. "essas variantes, como a que encontramos, são chamadas de thrifty genotypes, em inglês, ou genótipos poupadores", explica. "ou seja, em alguma época, quando as fontes de energia eram escassas, podem ter sido úteis, mas hoje são prejudiciais. a obesidade está associada a doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer, além de aumentar o risco para formas graves de covid-19." apesar de a maior parte da população brasileira ser miscigenada, a descoberta da nova variante não deve ser motivo de preocupação — a não ser para aquelas mulheres que a possuem, que são poucas. ela está presente em apenas 1% da população em geral, podendo chega a 3% no nordeste, região com maior ancestralidade africana. no caso de obesidade mórbida, no entanto, ela está presente em 10% das que apresentam o problema. "outra forma de ver isso é que, enquanto na população geral de mulheres (com ou sem a variante) 1,5% são obesas mórbidas, entre as que possuem a mutação esse índice é de 15%", diz tarazona. "ou seja, a presença da variante aumenta 10 vezes a chance de se ter obesidade mórbida." a baixa frequência dela na população não retira a importância da sua descoberta. > é muito relevante encontrar uma nova mutação com grande efeito sobre a obesidade > > marilia da silva